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ASSOCIAÇÃO A VERDADEIRA VIDA EM DEUS - BRASIL
Comunicado: 08/2017
Data: 20 de setembro de 2017
Meus irmãos e irmãs da AVVD,
PRECISA-SE DE VOLUNTÁRIOS PARA TRADUÇÃO (INGLÊS)
TLIG - SITE OFICIAL
Estamos trabalhando no novo site em português de AVVD. Estamos precisando de voluntários para tradução de artigos existentes no site em inglês e ainda não traduzidos para o português.
Através do novo site continuaremos a manter a família de AVVD informada a respeito das atividades de Vassula pelo mundo na difusão das Mensagens de Jesus, as notícias sobre a unidade dos cristãos, a espiritualidade de AVVD, etc.
O trabalho compreende a tradução do inglês para o português. Considere que este apelo não é para um trabalho esporádico, é um convite para integrar-se a uma equipe que trabalhará nestas traduções.
Você que conhece e vive as Mensagens, domina bem o inglês e tem parte do seu tempo livre para oferecer, considere esta oportunidade: trabalhar para JESUS.
“ Eu trabalhei e cansei-me, muitas vezes sem dormir. Tive fome e sede, e muitas vezes estive esfomeado, pela falta de amor. Senti-Me no gelo, por falta de amor. Por isso, tu que lês os Meus Escritos, cuidarás agora de Mim? Cuidarás dos Meus cordeiros? Não digas: "Não me incomodeis, que eu não posso satisfazer este Vosso pedido!". Hoje, digo-te, a ti que lês as Minhas Mensagens, que as Minhas Bençãos se darão a quem quer que se ocupe das necessidades desta casa, uma vez que tudo aquilo que fazes, mesmo a mínima coisa, a fazes a Mim. Sê, pois, abençoada, tu que Me ouves e farás a Vontade de Meu Pai. Todo aquele que fizer frente às necessidades desta casa, será largamente recompensado por Meu Pai que está no Céu”. (AVVD - Agosto de 1990)
Interessados: Entrar em contato com João Inácio através do e-mail:
Que Deus nos abençoe.
Leonardo Cesar Harger
Contato Nacional
Site oficial:
www.tlig.org/pg.html
Site AVVD Brasil:
www.avvdbrasil.org.br
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ASSOCIAÇÃO A VERDADEIRA VIDA EM DEUS - BRASIL
Comunicado: 07/2017
Data: 28 de agosto de 2017
Meus irmãos e irmãs da AVVD,
Quatro vozes da santidade russa
Clara Cortazar 1Diretora do coro da igreja ortodoxa San Martín de Tours, do Padre Enrique Bikkesbakker
Buenos Aires, Argentina, 12 de julho 2017
2As inserções de [foto], ao longo do texto, correspondem às ilustrações apresentadas em powerpoint pela autora no decorrer da palestra e podem ser acompanhadas logo abaixo do texto da palestra.
áudio: Quatro vozes da santidade russa - clique para ouvir
Quatro santos, assim como são quatro os evangelistas, quatro os seres vivos que sustentam o Carro de Deus. Quatro santos, como quatro os pontos cardeais, quatro ventos, quatro estações. Este ‘quatro’ nos situa, ao mesmo tempo, em uma estrutura sólida e em uma encruzilhada.
Quatro vozes constituem a mais perfeita polifonia, a mais adaptada às quatro vozes naturais dos seres humanos. E estes quatro santos nos permitiram ouvir a mais pura sinfonia de vozes em um século dominado pelo ruído e pela estridência.
Os quatro eram russos, três deles nasceram em diferentes regiões desse vasto Império que atingiu o seu declínio no final do século XIX: Maria, em Riga, às margens do mar Báltico (hoje Letônia); Tikhon [Tírron]3Em russo: Тихон. A pronúncia é Tírron, apesar da grafia em português Tikhon. O dígrafo kh tem o som de um h aspirado ou o equivalente à pronúncia do rr em português, menos acentuada. Em espanhol a grafia é Tijon, seguindo a pronúncia real do nome. Em razão do áudio do texto, adotaremos a grafia da pronúncia: Tírron. em Pskov, não muito longe da fronteira da Estônia; João no sul, Kharkov (hoje Ucrânia). Isabel nasceu na Alemanha e se tornou russa por amor: amor por seu marido, em primeiro lugar; amor a esse povo que adotou como seu. Os quatro foram marcados com fogo pela Revolução que neste ano é lembrada pelo seu centenário, revolução bolchevique violentamente antirreligiosa e anticristã que, paradoxalmente, contribuiu para a glória e santidade da Igreja, não só da Rússia, mas universal. Porque estes santos são santos não porque tenham sido virtuosos e exemplares, mas na medida em que participaram da santidade de Deus (nada mais universal do que o próprio Deus) e, portanto, "a Luz dos homens – Deus - passa através deles, o poder de Deus passa através deles" (São João de São Francisco) e se comunica a todos, sem fazer distinção de países ou de pertenças eclesiásticas.
Dois homens e duas mulheres. Dois deles, Tírron e Isabel, uniram seus destinos ao da nação russa. Os outros dois, Maria e João, viveram no exílio a maior parte de sua vida e projetaram a santidade russa na Europa Ocidental, Ásia e América. Eram todos ortodoxos, mas pelas vicissitudes da história terminaram pertencendo a três Igrejas diferentes, um sinal de que a santidade não se atém a formalidades jurisdicionais.
Os quatro revelam tipos diferentes de santidade, mais ou menos tradicionais, mais ou menos em linha com o imaginário de santidade (ou o estereótipo de santidade) prevalecente nas Igrejas ortodoxas. Os quatro foram monges, mas em contextos muitos diferentes, com aspirações e realizações distintas.
Tírron e Isabel nasceram em 1864. Uns trinta anos mais velhos que Maria, nascida em 1891, e João, nascido em 1896, e, portanto, de uma geração anterior. É provável que Tírron e Isabel tenham se encontrado alguma vez. Já os mais jovens, muito provavelmente tiveram notícia dos mais velhos pela exposição pública de seus nomes; mas os dois, propriamente, perdidos na imensidão da diáspora, não souberam nada um do outro, pelo menos até 1950, quando Maria já havia "nascido no céu."
Vamos abordá-los, portanto, de dois em dois neste itinerário ao mesmo tempo luminoso e sofredor, divino e humano, como o Senhor na Cruz, itinerário que pretendo expor a vocês neste breve tempo que me foi destinado.
Tírron era filho de um presbítero rural e seguiu natural e normalmente a “carreira” eclesiástica. Era o que lhe impunham sua condição, sua família, os costumes da época. Muito rapidamente, suas condições intelectuais, seu caráter agradável e sua piedade sem falhas tornaram-se evidentes e ele subiu os degraus da hierarquia até chegar a bispo aos 32 anos, em 1897 . Até aí, uma existência linear e sem sobressaltos.
Isabel era uma bela moça, da mais elevada nobreza europeia. Da família Hesse-Darmstadt, neta da rainha Vitória da Inglaterra pelo lado materno, luterana e muito elegante. Conheceu o Grão-Duque Sergio Romanov, quarto filho de Alexandre II (o czar progressista) , alguns anos mais velho do que ela, e se apaixonaram loucamente. Seu casamento em São Petersburgo, em 1884, foi um acontecimento de repercussão midiática. Eram multidões aclamando, carros alegóricos e rosas brancas por toda parte, porque gostavam da noiva. Além disso, teve consequências políticas porque nessa festa se conheceram o futuro czar Nicolau II e a irmã mais nova de Isabel, Alexandra, que seria a Czarina dez anos depois.
Nem Isabel nem Sergio eram atraídos pela vida mundana, e viviam boa parte de seu tempo em uma residência rural. Isabel se interessa cada vez mais pelo idioma e pela cultura russa, tanto a folclórica quanto a acadêmica. Torna-se profunda conhecedora da arquitetura religiosa e da literatura russa do século XIX. Eles não têm filhos, mas adotam dois sobrinhos. Até aí, uma existência linear de qualquer filha da alta nobreza europeia.
Mas Isabel também se interessou pela ortodoxia e acabou confessando a fé ortodoxa no Sábado de Lázaro em 1892. seu marido chora de alegria por poder comungar junto dela na Quinta-feira Santa seguinte. Mas seu pai luterano ficou tão horrorizado com essa decisão que nunca mais teve contato com ela.
E aqui entramos numa fase indispensável para toda santidade: a das rupturas. Quem não odeia seu pai e sua mãe, sua esposa e seus filhos, seus irmãos e irmãs e até sua própria vida, não pode ser meu discípulo – diz Jesus (Mt 10, 37; Lc 14, 25). Ainda que saibamos que a palavra "odiar" não tem no aramaico a conotação maligna que tem em nossas línguas, ainda que saibamos que isso significa bem mais uma distância, um desapego, uma separação, a fórmula é contundente.
A transmissão da santidade provoca em nós "separações", "discriminações". Manifestei o teu Nome aos que me deste tirando-os do mundo (Jo 17, 6) – diz Jesus ao Pai ... Por isso os santos são sempre de uma surpreendente originalidade e uma surpreendente liberdade.
____Cortazar. Santos 2005, p. 7-8
Não estão condicionados pelo seu meio ou por sua herança. Porque a pessoa única de cada um é forjada lentamente por força de rupturas, como o escultor faz aparecer a beleza de uma forma pela força de marteladas que tiram todo o supérfluo do bloco original. E é essa pessoa única o que Deus busca paciente e ansiosamente, esse “cara a cara” único com cada uma de suas criaturas.
Apenas alguns anos depois de Isabel, Tírron vive sua primeira grande ruptura. Em 1896, é nomeado bispo... do Alasca e Ilhas Aleutas! Primeiro contato com mundos até então desconhecidos: os inuítes ou esquimós, por um lado (que tinham sido evangelizados por São Inocente do Alasca, no século XIX); os norte-americanos, por outro. Sua sede ficava em São Francisco (cidade que devem recordar), mas mudou-se para Nova York porque as imigrações de ortodoxos de diversas igrejas eram muito mais numerosas no leste do que no oeste dos Estados Unidos. Tírron visita incansavelmente suas paróquias , até as mais distantes, embora exigissem dele verdadeiras façanhas de esforço físico pelas dificuldades de transporte e de tempo, devido às enormes distâncias e aos caminhos precários.
Mas, além dessa tarefa pastoral em contato direto com as pessoas, Tírron se lançou na tarefa hercúlea de dar uma estrutura mais sólida ao mosaico de comunidades ortodoxas instaladas em todo o vasto território dos Estados Unidos, do Alasca à Flórida. Constrói sua catedral de São Nicolau em Nova York ; abençoou também as paróquias do Patriarcado de Antioquia, que não tinham bispo no local, e participou da consagração do bispo Rafael (Hawawíni), da Igreja Ortodoxa de Antioquia, primeiro bispo ortodoxo consagrado em solo americano e futuro santo; estabeleceu relações muito sólidas com a Igreja Anglicana; fundou um seminário para a América do Norte, o Seminário São Tírron de Zadonsk; editou textos litúrgicos traduzidos para o inglês. Finalmente, convocou o Primeiro Concílio de toda a América, em Mayfield, em 1907 . Sua ação foi tão notável que ele foi nomeado cidadão emérito dos Estados Unidos.
O que acontecia com Isabel na Rússia? A situação política e social deteriorava-se. A guerra russo-japonesa foi desastrosa para a Rússia.
Isabel organiza ajuda para as vítimas. Nas próprias salas do Kremlin manda instalar mesas de trabalho, envia provisões para a frente de guerra, roupas, remédios e também Bíblias e ícones para os soldados. Em Moscou, organiza um hospital para os feridos, coordenado com um trem sanitário. Tem uma extraordinária capacidade de organização e sua imensa tarefa é praticamente a de um ministério.
____Cortazar, De Gloria en Gloria, p. 21
Mas a situação começa a ser desesperadora. Em janeiro de 1905, estoura o que se chama de "a primeira revolução russa", em São Petersburgo, e especialmente na guarnição de Kronstadt. Foi o que se chama de "Domingo sangrento". O exército abre fogo contra os manifestantes e a indignação popular é enorme. Apenas um mês depois, em Moscou, em 18 de fevereiro, Sérgio, o marido de Isabel, é destroçado por uma bomba lançada contra sua carruagem. Isabel chega imediatamente ao local do crime e, com suas próprias mãos, recolhe os pedaços do corpo de seu amado marido... Três dias depois, vai visitar na prisão o assassino que havia lançado a bomba ao grito de: Abaixo o Czar!, viva a Revolução!, mas o assassino não quis aceitar nem o perdão de Isabel nem o pedido de indulto que ela havia feito ao Czar. Ao sair da prisão, Isabel disse com tristeza: "Fracassei, mas... quem sabe?" Nesta ruptura dolorosíssima, atroz, Isabel começa o grande caminho de sua santidade. Se retira para viver em uma casa modesta e funda um hospital aonde vai todos os dias. Sua vida espiritual se aprofunda, muda sua visão do mundo...
Em 1907, Tírron deixa a América e volta para a Rússia: foi escolhido para ser bispo de Yaroslav. Mas já não é mais o mesmo Tírron. A imensa tarefa desenvolvida nos Estados Unidos o havia preparado para retornar à Rússia com uma visão nova da organização e da vida concreta da Igreja. Ele tinha vivido em uma sociedade diferente, em um mundo de pensamentos diferentes, com luzes e sombras diferentes. Sem que o soubesse, a nova ruptura o lançava para o alto.
Mas a Rússia também tinha mudado, e drasticamente. Apesar de algumas concessões tímidas do Czar, da convocação de um parlamento (a Duma) e do início de uma reforma agrária, a agitação social e política estava aumentando. A própria Igreja começou a reivindicar a autorização para convocar um Concílio e restaurar a organização tradicional da Igreja (que, como devem se lembrar, havia sido destruída por Pedro, o Grande, no século XVIII). Esse Concílio só pôde se reunir em 1917 ... Tírron, como membro do sínodo, participou dessas reivindicações.
Vamos, portanto, nos situar em 1908: Isabel se ocupa com sua casa e seu hospital; Tírron é bispo de Yaroslav. Maria ainda é uma adolescente. João tem 12 anos de idade. O ambiente social e intelectual é explosivo: a radicalização aumenta, tanto no campo filosófico como no político. A cultura russa, muito ocidentalizada ao longo dos séculos XVIII e XIX (e, portanto, influenciada pelo iluminismo, positivismo, darwinismo, marxismo) começa a reagir em alguns dos seus membros mais notórios. Vamos citar apenas três desses pensadores, filósofos, cientistas ou economistas: Nicolai Berdiaev (1874-1948), um dos pensadores existencialistas mais lúcidos de sua geração; Serguei Bulgakov (1871-1944), economista; Pavel Florensky (1882-1937), cientista brilhante. Todos eles professores universitários desencantados com o marxismo, tendo intuições místicas e, às vezes, buscas esotéricas, que, em seu caminho, descobrem a beleza do cristianismo ortodoxo. Fundam uma revista (Vekhi, Marcos), que produziu comoção: ali se declara abertamente que só o cristianismo tem o poder de converter a humanidade, que é o único caminho no mistério da vida. A influência desses espíritos iluminados, aparentemente efêmera (quase todos tiveram logo que se exilar ou morreram em campos de deportação), manteve acesa a chama incandescente do pensamento russo ao longo do deserto soviético.
Mas esses casos eram a minoria. A maioria dos intelectuais russos era fervorosamente socialista, pró-ocidental e marxista. Eles se reuniam em salões literários e filosóficos onde ferviam as ideias e faltavam fatos concretos. A um desses salões comparece Liza, a futura Maria, que já tinha 19 anos e havia se casado e divorciado . Um temperamento indomável, caótico, e de extraordinária criatividade: ela pinta, compõe poemas, borda, estuda Belas Artes, dá aula aos trabalhadores nas fábricas de São Petersburgo. É uma revolucionária fervorosa, mas também amiga dos grandes poetas simbolistas da época (Blok, Ivanov). Nada pressagiava seu futuro iminente.
Entretanto, para Isabel e Tírron, que já têm 46 anos, se pressagiam acontecimentos dramáticos.
Tudo está indo de mal a pior, e não há a menor ilusão de tempos melhores... Mantemos nervos fortes, e não pensamos em partir: viverei e morrerei aqui. - Carta de Isabel a um irmão, por volta de 1908.
____Cf. Cortazar, De Gloria... p. 23
Em 1908, Isabel decide tornar-se monja. Não em uma ordem, porque na ortodoxia não há ordens monásticas como no Ocidente, mas no estado monástico, que é selado pelos três votos clássicos de castidade, obediência e pobreza. A vocação social de Isabel e seu espírito de organização a levam a se instalar em Moscou onde, com a venda de todos os seus bens, compra um terreno para construir, em primeiro lugar, um mosteiro, de Marta e Maria, junto a uma igreja. Mas também um hospital de 22 camas, uma clínica médica para os pobres, um orfanato, uma escola para 75 meninas trabalhadoras, uma biblioteca de dois mil volumes, uma casa para tuberculosos, uma farmácia e uma cozinha onde se fazia todos os dias a sopa popular. Muitas mulheres a seguem nesta vocação: seis anos depois, já são 97 monjas. Não correspondem à imagem que os russos têm de um monge naquela época porque, desde Pedro o Grande, os mosteiros não têm direito ao trabalho social; correspondem melhor às instituições ocidentais de São Vicente de Paulo ou de outras ordens "hospitalares". Isabel é duramente criticada como "protestante", "violadora do espírito ortodoxo", "desconhecedora da grande tradição russa"... Isabel não se importa. Sonha até em restaurar o antigo diaconato feminino...
Em 1914 estoura a Primeira Guerra Mundial. A Rússia, aliada da França e da Sérvia, se sentiu compelida a participar. Foi a última terrível catástrofe antes da Revolução. O exército russo esgota na frente ocidental as poucas forças que lhe restam. Tanto Tírron quanto Isabel realizam esforços titânicos para ajudar os soldados e civis abandonados à própria sorte perto da frente com a Alemanha.
E, em fevereiro de 1917, ainda em plena guerra, estoura a revolução liberal. A enfraquecida monarquia é aniquilada, o Czar tem que abdicar, é constituído um governo socialista muito frágil e o país se afunda em uma anarquia sem precedentes. Nestas condições dramáticas, em 21 de junho, Tírron é eleito bispo de Moscou.
O esperado Concílio Pan-Russo finalmente se reúne em 15 de agosto de 1917, em meio ao caos generalizado e à luta sem quartel entre mencheviques e bolcheviques. Eram 250 clérigos e 314 leigos (mais leigos do que clérigos, e entre eles estava Eugraph Kovalevsky, pai do futuro Monsenhor Jean Kovalevsky). Não falarei desse Concílio extraordinário porque o padre Domingo Krpan nos contará mais amplamente sobre ele em agosto. Direi apenas que o Concílio decidiu restaurar o Patriarcado e, em 5 de novembro de 1917, na Catedral do Cristo Salvador, em meio ao estrondo da artilharia bolchevique, que bombardeava o Kremlin, Tírron foi eleito Patriarca de Moscou. "Seu Gólgota e sua glória estavam à sua espera", diz um de seus biógrafos.
A revolução de outubro havia triunfado, com Lênin à frente. E os ataques à Igreja começaram imediatamente, programados e realizados pelo mesmo Lênin que, muito otimista, pensava terminar, com um só golpe, a Igreja.
Em 4 de dezembro, todos os bens da Igreja foram confiscados; em 11 de dezembro, todas as escolas teológicas foram fechadas; em 18 de dezembro, o casamento civil tornou-se obrigatório; em 23 de janeiro de 1918, foi adotada uma legislação antirreligiosa.
____Zernov, p. 249-250
Antes do encerramento do Concílio, no verão de 1918, os membros receberam a notícia, horrorizados, do atroz assassinato de Vladimir, Metropolita de Kiev...
____Ware, p. 114
Em abril de 1918, a polícia prende Isabel em seu mosteiro, diante das irmãs... Última e decisiva ruptura. Com muita serenidade, lhes disse: "Não chorem, nos veremos no outro mundo", e lhes deu a bênção. Duas monjas foram com ela: Catalina e Bárbara. .... Foram levadas para os Urais, para Ecaterimburgo, onde já estava a família real... Na noite de 5 de julho, ela é levada, com sua companheira Bárbara e outros prisioneiros, para o poço de uma mina abandonada , e ali são jogados, a mais de quarenta metros de profundidade... O corpo de Isabel cai sobre uma rocha que se projeta a uns quinze metros de profundidade. Lá, começa a entoar o hino litúrgico dos Querubins, e as vozes de outros supliciados a seguem. À imagem dos Querubins, nestes mistérios cantamos o Três Vezes Santo à Trindade vivificante. Deixemos agora todas as preocupações do mundo para receber o Rei da Criação, escoltado por coros invisíveis de anjos. Aleluia, aleluia, aleluia. Os assassinos, indignados, lançam granadas e lenha em chama, até que os cantos se apagam.
Poucos dias depois, os camponeses das redondezas descem ao poço e encontram os cadáveres dos torturados. O corpo de Isabel está intacto, com os três dedos unidos em um último sinal da cruz...
____Cortazar. De Glória em glória, p. 31-32
(Só acrescentaremos, sem dar detalhes, que, depois de vicissitudes incríveis, esse corpo sempre intacto chegou a Jerusalém, à igreja russa do Monte das Oliveiras, onde Isabel queria ser enterrada e onde permanece.)
Os massacres, o caos e a fome espalhavam-se por toda a Rússia, também devastada pela guerra civil entre Vermelhos e Brancos. Lisa (a futura Maria), de 28 anos, e Miguel (o futuro João), de 23, têm que fugir da Rússia junto com sua família, como tiveram que fazer centenas de milhares de russos condenados à terrível provação do exílio. Foram para a Bulgária, Sérvia, Turquia, para onde pudessem... Lisa terminou em Paris com seu novo marido, Danilo Skobtsov, e seus três filhos. Miguel, tendo acabado de completar seus estudos de direito, entra na Academia de Teologia de Karlotsky e Bitol, na Sérvia. Rupturas dolorosas...
O novo patriarca, horrorizado com tudo o que acontece, multiplica seus apelos, seus pedidos de sensatez, suas sanções (inúteis, por sua vez) aos assassinos. Essa firmeza tranquila e inabalável contribuiu para aumentar seu prestígio.
No primeiro aniversário da Revolução, dirige-se ao Soviet dos Comissários do povo:
Os rios de sangue derramado de nossos irmãos, massacrados sem piedade por vossas ordens, clamam ao céu e nos obrigam a dizer-vos esta amarga palavra de verdade. ... Dividistes as pessoas em campos inimigos e as lançastes em uma guerra fratricida de uma violência sem precedentes. ... Exortamos-vos, a vós que usais vosso poder para perseguir o vosso próximo e exterminar os inocentes: ... libertai os prisioneiros, deixai de derramar sangue, violência, destruições, perseguições à fé... Dai ao povo a trégua que deseja e merece.
____13 de outubro de 1918
Mas, ao mesmo tempo, Tírron manifesta uma prudente abstenção no campo político. Nunca quis abençoar o exército "Branco", nunca quis entrar na luta estritamente política, porque considerava que todo governo (mesmo que seja sanguinário e persiga os cristãos) manifesta a vontade de Deus. Neste sentido, seguia o pensamento da Igreja primitiva, que rezava pelos Césares em meio às perseguições.
Sob a direção de Tírron, a Igreja se recusou a se identificar com o antigo regime ... Esta atitude, moralmente crítica e intransigente, mas politicamente leal, deu à Igreja uma autoridade excepcional.
____Meyendorff, p. 118
Mesmo assim, o Patriarca incomodava o governo soviético, principalmente porque tinha prestígio com o povo. Ele foi preso em 1922 e ninguém pensou que ele sairia vivo da prisão. As acusações eram terríveis: criminoso contrarrevolucionário, traidor; e a pena solicitada pelo promotor foi, naturalmente, a pena de morte. Mas, ao contrário de todas as expectativas, foi libertado um ano depois.
Saiu da prisão vestido apenas com um sobretudo militar, descalço, muito debilitado e enfraquecido: barba crescida, cabelos grisalhos e olhos afundados. E se encontrou com uma multidão de milhares e milhares de pessoas que o esperavam, bravamente, na praça em frente à prisão, e tinham acabado de ser informadas da resolução do governo. A polícia teve que fazer fila dupla para que Tírron pudesse chegar ao carro que iria transportá-lo, entre as aclamações e os prantos da multidão que caía de joelhos em sua passagem. O pobre ancião de 60 anos, que parecia de 80, não podia acreditar no que via, e chorava.
____Cortazar, De Gloria... p. 41
Nos dois anos que se seguiram, sofreu dois atentados fracassados e nasceu para o céu em 25 de março de 1925, dia da Anunciação. Foi dito – e continua sendo – que ele foi envenenado. Seu funeral foi acompanhado por uma multidão. Suas relíquias, que se acreditavam perdidas, foram encontradas no esconderijo de um mosteiro em fevereiro de 1992.
Enquanto isso, os emigrados russos em Paris, que são uma legião, vivem muitos deles em condições miseráveis. Danilo, o marido de Lisa, se torna taxista; ela mesma faz tarefas domésticas, peças de artesanato lindíssimas – porque é de uma extraordinária habilidade manual, especialmente em bordados. Mas a morte de sua filha mais nova, Anastácia, em 1926, deu o golpe decisivo para a conversão.
Senti que minha alma tinha vagueado por caminhos tortuosos toda a minha vida. Agora aspiro a uma estrada verdadeira, reta e clara... Nunca se inventou algo mais forte do que estas palavras: "Amai-vos uns aos outros". Mas é preciso ir até o fim.
Le sacrement du frère, p. 31
Os emigrados tentam nesse momento se organizar sob a direção tranquila e segura do Metropolita Eulógio Gueorguievsky. Lisa se separa de seu marido e está intensamente empenhada em ajudar seus compatriotas. Trabalha como secretária na Ação Cristã dos Estudantes Russos (ACER) cujos objetivos são, por um lado, denunciar as perseguições comunistas e, por outro, ajudar os russos exilados, tanto material como culturalmente. Inicia uma longa amizade e colaboração com Berdiaev , e especialmente com o padre Serguei Bulgakov, de quem já falamos, que se tornou um dos mais brilhantes teólogos ortodoxos de seu século. Ele fundou em Paris o Instituto São Sérgio , que existe até hoje, para a formação teológica e espiritual dos jovens russos, e torna-se para Lisa, cada vez mais empenhada em ajudar os necessitados, um pai espiritual.
Ele a estimula para um caminho cada vez mais árduo e exigente, e Lisa faz seus votos monásticos em 7 de março de 1932. Recebe o nome de Maria, de Santa Maria do Egito.
A situação, é preciso dizer, é rara. Lisa é divorciada duas vezes e tem dois filhos. Só por isso seu monasticismo está fora de qualquer esquema tradicional. Mas ela sabe que seu monasticismo é de outro tipo, liberado de suas formas exteriores conhecidas, mas igualmente exigente em sua essência: dar sua vida por Cristo e pelos irmãos.
____Cortazar, Santos ortodoxos, p. 50
Dirigindo-se a monges, lhes diz:
Abri vossas portas aos ladrões que não têm teto... Deixai entrar o mundo todo. Deixai vossos magníficos edifícios litúrgicos serem destruídos. Assumi o voto de pobreza com todo seu rigor devastador. Rejeitai todo conforto, ainda que monástico. Que vossos corações sejam purificados pelo fogo...
____Cortazar, Id, p. 51
Com uma audácia verdadeiramente evangélica e sem ter um centavo, decide fundar um Lar para pessoas sem teto. Consegue alugar uma casa em ruínas na Rua Lourmel (que se chama agora Maria Skobtsov) . Ela se instala em um canto, atrás da caldeira de água quente, e os ratos vêm visitá-la à noite através de um buraco que ela tenta fechar com um sapato.
Mendiga mercadorias e consegue toneladas de comida para muitos necessitados... Essa casa em ruínas, cheia de prostitutas, vagabundos, miseráveis, criminosos recém-saídos da prisão, se enche também com seus amigos teólogos, artistas, filósofos e pensadores. São dados cursos de gregoriano, de canto russo, de teologia e filosofia, de arte sacra.
Seu carisma de total abnegação é reconhecido por muitos. Mas também chovem as críticas: é descuidada, caótica, fuma... Não fica bem para uma monja! E, para culminar, ela mora com seu filho, Yuri, um adolescente. Duas novas monjas vêm morar com ela, as madres Eudóxia e Blandina, mas estas não conseguem aguentar nem o seu caráter explosivo nem a exigência sobre-humana que lhe permite passar dias inteiros sem comer nem dormir para ajudar os necessitados. Em seus poucos momentos livres, ela borda ícones ou escreve poemas que a tornarão uma das grandes poetisas russas do século XX.
Por volta de 1938, o padre Dimítri Klepinin e sua família vieram se instalar no abrigo da rua Lourmel. Entre Madre Maria e esta família surgiu imediatamente uma ligação espontânea, que tornou o abrigo da rua Lourmel um verdadeiro paraíso. Mas a França foi invadida pelos nazistas um ano depois, em junho de 1940... Um dos benfeitores mais abnegados do Lar, um judeu, Elias Bunakov-Fondaminski, foi preso poucos dias depois.
O Lar da rua Lourmel mudou de "rumo". Agora, são principalmente os judeus os que chegam, os que devem ser escondidos, a quem se devem fornecer documentos falsos e falsos certificados de batismo. O Lar está lotado... e ameaçado. Em 1943, a Gestapo prende primeiro Yuri, o filho de Madre Maria; imediatamente depois, o padre Dimítri; ambos morrerão no campo de extermínio de Dora no ano seguinte. Madre Maria é presa, por sua vez, e deportada para Ravensbrück. Lá, ela faz o esboço de um ícone, no qual a Mãe de Deus segura seu filho crucificado. Ela é enviada para a câmara de gás em 30 de março de 1945, algumas semanas antes de os aliados libertarem o campo.
Enquanto isso, na Sérvia, está surgindo outro santo, muito diferente. O jovem João continua sua carreira eclesiástica sem sobressaltos, em Karlotsky e Bitol. Baixinho, gago, feio e desorganizado. .... É professor no seminário de Bitol e lá começa a se forjar sua fama de santidade. Nunca dorme, comunga todos os dias (mesmo que a Divina Liturgia não seja celebrada: duas práticas ignoradas na Igreja Ortodoxa 4Para a abstinência do sono seguiu o exemplo de Meletios de Kharkov, bispo de sua cidade natal, + 1841.) e adota a oração perpétua. O Metropolita Antônio Khrapovitsky, seu pai espiritual, diz: "Nós nos pomos a orar, ele está sempre em oração". Em 1934, João é consagrado bispo e é enviado a... Xangai!!!! Uma nova ruptura depois da ruptura do exílio.
Em Xangai há uma grande colônia russa, vivendo em condições de pobreza extrema. É aí que seus dons milagrosos começam a se manifestar.
Chamado no meio da noite à cabeceira de uma criança moribunda, ele entra, vai direto ao altar dos ícones, prostra-se diante deles e então, ao se levantar, declara aos pais que a criança vai ficar curada e sai sem ter mesmo olhado para a criança. Na manhã seguinte, a criança está curada,
____Kovalevsky, citado por Cortazar, De Gloria ... p. 48
Todas as manhãs e todas as tardes celebra os ofícios na Catedral, e celebra a Divina Liturgia todos os dias, ancorado na oração contínua. Várias vezes, durante a celebração, se produziram fenômenos luminosos que todo mundo pôde constatar, sem que ele prestasse a menor atenção neles. Visita uma infinidade de pacientes, a quem cura, consola, reconforta. Era conhecido em todos os hospitais e centros psiquiátricos de Xangai. Funda um orfanato para filhos de russos ou de chineses, onde abriga mais de 400 crianças. Mas com a chegada dos comunistas, em 1949, eles têm que escapar de Xangai. São várias centenas de pessoas, entre elas as 400 crianças do orfanato. Se estabelecem como refugiados nas Filipinas, em acampamentos de uma terrível precariedade, e só muitos meses depois conseguem embarcar para os Estados Unidos. Os filipinos disseram: "Agora que o homenzinho se foi, vamos ter problemas. O homenzinho abençoa seu acampamento nas quatro direções, todas as noites". E, de fato, pouco depois da partida, um terrível tufão destruiu o acampamento já abandonado.
À sua chegada aos Estados Unidos, as autoridades os retêm no porto e não querem recebê-los. Consegue um prazo de três dias e vai imediatamente a Washington para encontrar as pessoas capazes de ajudá-lo. Como ninguém o recebe, ele se senta nos degraus do Palácio do Congresso e deixa passarem as horas, as noites, os dias, com o seu rosário na mão. Acaba sendo chamado e ouvido, e consegue, para todos os seus, o direito de asilo nos Estados Unidos...
____Kovalevsky, p. 193
Mas uma nova ruptura se preparava.
Em 1951, ele é nomeado arcebispo de Bruxelas e da Europa Ocidental. Durante sua estadia na Europa, reside com frequência na região de Paris, dedicando seu tempo à fundação russa de Ste. Geneviève des Bois e Versalhes, aonde vai de trem. E não é raro que os passageiros da estação de Montparnasse tenham o espetáculo pouco banal deste monge pequeno e feio, insolitamente trajado, sempre descalço, instalado na sala de espera com seus ícones dispostos em círculo ao seu redor, e escrevendo, imperturbável, em uma máquina de escrever portátil. Claro que não passava despercebido, mas ele estava muito além do "respeito humano". Sua reputação de santidade já havia ultrapassado os ambientes ortodoxos, e sabe-se que um padre católico em Paris contou um dia a um de seus paroquianos: "Você pede provas, você diz que hoje não há mais milagres nem santos. Por que irei lhe dar provas teóricas, quando hoje mesmo anda pelas ruas de Paris um santo: São João Descalço?"
____Kovalevsky, p.195
Ele não dorme há anos e vive em uma cela sem cama, com pacotes de cartas importantes cuidadosamente amarrados com cordas e arrumados pelo chão ao redor de sua mesa. Para ele, o dia de 24 horas são 24 horas de oração, e com toda a naturalidade dá entrevistas à meia-noite ou às três da manhã.
____Bourne, p. 260
Viveu na China como um chinês. Agora vivia na Europa Ocidental como um francês ou um alemão. Celebrava a Liturgia em várias línguas, como antes já havia feito em chinês e como depois faria em inglês.
____Mileant, p. 13
A alma de João, profundamente russa, se expande para as dimensões do universo.
É em suas mãos – providencialmente e por um tempo - que seria confiado o destino da Igreja Ortodoxa da França, iniciada 20 anos antes e dirigida pelo Padre Eugraph Kovalevsky, Igreja cuja vocação era e é fazer surgir a fé ortodoxa da Igreja indivisa nos países ocidentais. João estuda a situação da Igreja Ortodoxa da França, estuda o rito galicano que esta celebra, e em 8 de maio de 1960 celebra o rito de acordo com São Germano, na igreja Sto. Irineu de Paris. E diz em sua homilia:
O Cristo ressuscitado enviou os Apóstolos a pregar por todos os países. A Igreja de Cristo não foi fundada para um único povo, para um país em particular, mas todos os países são chamados à fé do Deus verdadeiro. ... Assim, desde os tempos apostólicos, na Gália – a França atual - foi pregada a fé ortodoxa do Cristo. À Igreja Ortodoxa pertencem São Martinho de Tours, o grande Cassiano, fundador da abadia de Marselha onde, durante muitos anos, deu exemplo de vida ascética; o próprio S. Germano de Paris, Santa Genoveva e uma multidão de outros santos. Por isso, a fé ortodoxa não é para o povo francês a fé de um povo estrangeiro. Esta fé é a sua, confessada aqui, na França, desde os tempos antigos pelos antepassados; é a fé de seus pais... Que a bênção divina seja sobre a França ortodoxa".
____Homilia de 8 de maio de 1960. Em: Bourne, vol. II, p. 276
Sua dedicação à Igreja da França não cessou até o último momento de sua vida. Mesmo quando teve que abandonar a Europa e retornar a São Francisco, nos Estados Unidos, em 1962, por ordem de suas autoridades eclesiásticas (o Sínodo da Igreja Russa no exílio, ROCOR), o então Arcebispo João protegeu, orientou e confirmou essa Igreja nascente. Contra toda a oposição, consegue consagrar seu primeiro bispo, Monsenhor Jean de Saint Denis , em São Francisco, em 11 de novembro de 1964.
Assim, João Maximovich torna-se o elo histórico indispensável para o florescimento das Igrejas Ortodoxas no Ocidente. É nosso dever enfatizar esse aspecto de sua missão, uma vez que nos interessa diretamente e pode não ser percebido pelos fiéis russos com a mesma nitidez e a mesma urgência. A clarividência do arcebispo se manifestou não apenas em circunstâncias particulares, não apenas na vida de algumas pessoas, mas também no destino dos povos. Sua caridade não só foi mostrada aos doentes e aos moribundos, mas às comunidades eclesiais que precisavam de orientação e proteção. Suas atitudes abriram um caminho universal para a ortodoxia no momento em que esta sofria a mais dolorosa perseguição de sua história, e mostraram o sentido providencial do exílio de milhões de russos, ucranianos, romenos... Desse sofrimento surgiria uma Igreja Ortodoxa múltipla e una, enraizada na santidade de alguns homens e mulheres excepcionais, entre os quais o arcebispo João brilhou com uma luz particular.
____Cortazar, p. 53
Morreu em Seattle, durante uma viagem pastoral, em 2 de julho de 1966. Seu corpo, intacto, está exposto à veneração dos fiéis na Catedral da Mãe de Deus, Alegria de Todos os Aflitos, em São Francisco, que ele contribuiu para construir.
Sua proteção e presença também sobrevoam a cidade de Buenos Aires. Há relíquias dele na Igreja Ortodoxa da Trindade, do Parque Lezama, e essa pequena comunidade argentina, a nossa, o venera com fervor.
a Glorificação
Há inúmeros santos que não foram "canonizados", como dizemos no Ocidente. Eles são desconhecidos para nós, que vivemos do outro lado do véu.
O reino do Cristo nos Céus ficaria cheio de tristeza e muito reduzido se tivesse apenas os santos cujos nomes estão inscritos no calendário.
____Nicolay Velimirovich, citado por Cortazar, Santos, p. 11
O ato de "glorificação" é um testemunho do Espírito que inspira a Igreja e lhe abre os olhos para os portadores do Espírito. ... Mas é preciso ressaltar que a canonização não faz um santo nem decide o seu destino eterno. Pela canonização, a Igreja terrena não pretende conferir ao santo uma certa parte da glória supraterrestre. Na verdade, trata-se de um ato não voltado para a Igreja celestial, mas para a Igreja terrestre, para convidá-la a venerar a pessoa canonizada nos moldes e de acordo com as formas tradicionais do culto público.
____Bobrinskoy, citado por Cortazar, Santos, p. 9
Essas quatro vozes da santidade russa são as do martírio, isto é, as do testemunho, cumprido até o fim com a heroica fidelidade à missão que Deus lhes propôs. Testemunho de quê? Do amor de Deus para com os homens e da caminhada lenta dos homens para seu destino de deificação.
Esta santidade já foi dada aos cristãos, mas também está chegando. A santificação não pode se deter porque nunca é definitivamente adquirida. É um dinamismo que não pode deixar de se manifestar cada vez mais intensamente até o Retorno do Senhor.
____Ménestret, p. 29.
E essas quatro vozes da santidade russa nos desafiam, a nós argentinos do extremo Ocidente, tão queixosos e tão imaturos. E por elas Deus nos pede hoje que honremos o sofrimento e a glória inimagináveis de uma Igreja que, no século XX, doou para a Igreja universal mais mártires do que teve a Igreja cristã nos vinte séculos anteriores.
A seguir, ilustrações apresentadas em powerpoint pela palestrante no decorrer da exposição. Elas podem ser identificadas no texto acima, pois aparecem na sequência da leitura; e posicionando o cursor do "mouse" sobre a imagem no texto é possível ver a numeração da imagem e texto explicativo. Clicando-se sobre a imagem, pode-se vê-la ampliada em toda tela.
Quatro Vozes da Santidade Russa
Clara Cortazar
Buenos Aires, Argentina
12 de julho de 2017
Ilustrações apresentadas em Powerpoint
Fim das Ilustrações apresentadas em Powerpoint
Que Deus nos abençoe.
Leonardo Cesar Harger
Contato Nacional
Site oficial:
www.tlig.org/pg.html
Site AVVD Brasil:
www.avvdbrasil.org.br
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- Categoria: Comunicados
ASSOCIAÇÃO A VERDADEIRA VIDA EM DEUS - BRASIL
Comunicado: 06/2017
Data: 24 de agosto de 2017
Meus irmãos e irmãs da AVVD,
Rússia, espirituralidade ortodoxa.
Breve história da espiritualidade russa
Palestra ecumênica sobre a Rússia no centenário de Fátima
O chamado profético para a Igreja Ortodoxa Russa em nosso tempo
Padre Enrique Bikkesbakker 1Presbítero ortodoxo, pertence à Paróquia San Martín de Tours desde 1978, em Buenos Aires, Argentina.
Buenos Aires, Argentina, 23 e 30 de jun 20172Em duas igrejas de Buenos Aires: a primeira, do padre Matias Morea, Pároco de N. Sra do Perpétuo Socorro e a segunda, do padre Daniel Aguilera, católico romano, Pároco da Igreja do Menino Jesus de Belém, que participou do IX Retiro Latino-americano A Verdadeira Vida Em Deus, em Aparecida, SP, em novembro de 2016.
áudio: Breve história da espiritualidade russa - clique para ouvir
Falar da história da espiritualidade russa numa reunião é impossível: há muito que dizer. Mas vou fazer um breve resumo porque uma coisa é falar da história, outra coisa é falar da espiritualidade.
O Senhor disse a Vassula:
Eu Me proponho mostrar Meu esplendor e Minha Glória a cada nação que vive debaixo destes céus através de tua irmã Rússia. Eu a revestirei de Minha Beleza e Minha Integridade e a apresentarei com orgulho diante de teus irmãos a fim de que possam ver por ela e nela Minha Beleza e Minha Integridade. (24.12.1989)
{Lembrem-se disto: Minha beleza e Minha integridade.}3Os trechos entre chaves são comentários do palestrante não incluídos no texto escrito de sua palestra original, transcritos e traduzidos do áudio da palestra. (N. da T.)
Para compreender melhor estas palavras do Senhor, é necessário imergirmos brevemente na história da espiritualidade da Igreja russa.
Segundo narra a Tradição, o Apóstolo André foi o encarregado de levar a luz da Revelação cristã à Europa Oriental. Depois de proclamar o Evangelho no litoral da Grécia, às margens do Mar Negro, subiu o rio Dnieper até umas formosas colinas em Kiev onde ergueu uma cruz e disse:
“Neste lugar resplandecerá a Bênção divina. Serão erguidas igrejas a Cristo e a luz verdadeira se propagará daqui a todos os países.”
{Notaram a semelhança entre o que Jesus disse a Vassula e o que estamos dizendo aqui? Estamos falando do apóstolo André, que é padroeiro da Grécia, da Rússia, da Irlanda. Três apostolados.}
Dali o Apóstolo seguiu seu caminho chegando perto do Mar Báltico, batizando numerosos adeptos em diferentes centros e povoados.
Como reconhecimento da presença evangelizadora de Santo André, o Patriarca Partênio, de Constantinopla, no século XVII, doou a Moscou a mão até o cotovelo do Apóstolo, relíquia que permaneceu guardada na Catedral da Dormição da Virgem até a Revolução Bolchevique.
Oitocentos anos depois da semeadura apostólica de Santo André, o Patriarca de Constantinopla, Fócio, envia à Bulgária (em 862) dois irmãos gregos de Tessalônica: Cirilo (826-69) e Metódio (815-85) com a missão de evangelizar o povo búlgaro. O povo búlgaro é limítrofe com o povo russo. A obra foi muito frutífera e foi coroada com o batismo do Príncipe Bóris e de seu povo.
Como preparação para a tarefa missionária, São Cirilo e São Metódio – mais especificamente São Cirilo – substituiu o antigo alfabeto eslavo que se falava na região por um novo, muito mais simples e admiravelmente adaptado aos sons eslavos, tendo por base as letras gregas. Isto permitiu realizar o enorme trabalho de traduzir a Bíblia a esse idioma, tarefa imprescindível para a posterior confecção dos livros litúrgicos.
{O fato fundamental é que não se tratou de se impor um idioma, mas de se pôr serviçalmente sob um povo e de transmitir através do próprio idioma do povo – é o que se chama de não colonização, mas de cristianização de um povo. Cristo se pôs debaixo de nosso domínio, não acima. Se fez judeu, Se criou com o povo de Nazaré, respeitou as leis... – isto é todo um processo de kenosis4Doutrina do Esvaziamento de Jesus Cristo. Cristo, sendo Deus, ao vir ao mundo Se esvaziou de Seus atributos divinos - transcendência, onisciência, onipotência, onipresença, Sua total Glória e esplendor - para se tornar igual aos Homens, exceto no pecado. (N. da T. Fonte: Wikipédia, em 24.08.2017) – e se pôs a serviço do povo para a evangelização. Este é um trabalho maravilhoso que nos ensinam todos os homens santos – mas não foram santos por isso.}
No final do mesmo século, o rei Simeão, o Grande, século IX (893-927), converte a Bulgária em uma potência europeia e herdeira da cultura civil e espiritual de Bizâncio. Então, reproduzem-se em grande escala a Santa Escritura e os livros litúrgicos traduzidos para o eslavo por Cirilo e Metódio – e isso será decisivo para a cristianização da Rússia.
O exército do Príncipe Sviatoslav, príncipe de Kiev, em 967 conquista toda a parte oriental da Bulgária, mas respeita as igrejas e o clero. A ocupação russa enriquece as relações culturais e comerciais entre os dois países e permite o intercâmbio religioso, favorecido pelas traduções de São Cirilo e São Metódio à sua própria língua.
A mãe do Príncipe Sviatoslav, Olga, {e agora chamo a atenção para o seguinte: sempre por trás de qualquer trabalho evangélico, de qualquer trabalho espiritual, há uma mulher, sempre; está na Bíblia, nós é que não vemos, mas sempre, absolutamente sempre} e aqui está Santa Olga de Kiev que já havia abraçado o cristianismo alguns anos antes desta conquista. Foi a primeira princesa russa que abraçou o cristianismo. No entanto, seu filho, o Príncipe Sviatoslav, que foi quem conquistou a Bulgária, jamais aceitou se converter ao cristianismo, mas seu neto Vladimir foi educado por ela cristãmente desde pequeno.
Vladimir seguiu o pai na vida pagã e guerreira nos primeiros anos de seu principado, mas depois, através dos anos, e pela perseverante influência de sua avó, Santa Olga, lentamente foi despertando nele um chamado à sua conversão pessoal e à de seu povo.
Apesar de ter sido iniciado por Santa Olga no cristianismo bizantino, a Tradição nos conta que Vladimir quis assegurar-se da escolha, para ele e para seu povo, enviando uma delegação de observadores para que estudassem as práticas islâmicas entre os árabes, as do judaísmo que professavam os cazares – cujo reino estava situado na região baixa do Volga – e as da Igreja latina que atuava no Ocidente (até esse momento não havia divisão, havia uma só Igreja cristã). Nenhuma dessas religiões produziu nos enviados uma impressão tão favorável como o esplendor da liturgia bizantina quando visitaram a catedral de Santa Sofia em Constantinopla. O narrador da crônica russa relata:
“Não sabíamos se estávamos no Céu ou sobre a Terra, já que na Terra não se encontra semelhante beleza.”
{Na Terra não se encontra semelhante beleza.}
“Assim, portanto, não sabemos o que devemos dizer, mas sabemos, sim, de uma coisa: é que Deus mora ali com os homens...”
Estas palavras ultrapassam infinitamente a impressão estética da liturgia que presenciaram. É a beleza da presença de Deus diante dos homens o que arrebata as almas e as transporta, {não a beleza de uma boa liturgia, de algo bem decorado.}
Lembram-se das palavras do Senhor a Vassula? (... Eu a revestirei da Minha Beleza e Minha Integridade...)
A beleza manifesta o divino. E quem é que manifesta esta beleza? O Espírito Santo. Por isso, São Cirilo de Alexandria, Patriarca, Padre da Igreja do século quarto, precisa que o próprio do Espírito é ser o Espírito de beleza.
Passando por alto o acontecimento histórico que também contribuiu para a conversão da Rússia, nos deparamos com o Príncipe Vladimir que se batiza junto com seu povo na primavera de 988 – por isso 1988 foi o milenário da Igreja Russa – consagrando-se a organizar um Estado verdadeiramente cristão.
Os contemporâneos de Vladimir afirmam unanimemente que seu caráter e sua maneira de viver sofreram uma transformação radical em todos os níveis: consulta os bispos acerca dos assuntos do Estado, reorganiza a Justiça, elimina a pena de morte. {Foi apresentar-se ao Patriarca de Constantinopla para dizer-lhe que um povo cristão com um Patriarcado Bizantino – que foi o patriarcado mais importante do Oriente – não poderia conviver com a pena de morte, mas deveria extingui-la. Notam como houve a conversão?}
A conversão a uma vida verdadeiramente cristã se estende a várias gerações começando por seus filhos – São Bóris e São Gleb – ambos mártires, assassinados pelo terceiro filho de Vladimir, Sviatopolk, porque, apesar de ambos terem um exército superior ao de seu irmão, se negaram a lutar contra ele pela sucessão do trono do principado de Kiev. As últimas palavras de São Bóris antes de seu assassinato foram:
“Senhor, Tu sofreste por nossos pecados; torna-me digno de sofrer por Ti. Não morro nas mãos de meus inimigos, mas nas de meu irmão. Não lhe atribuas este assassinato como um pecado.”
Já vamos vendo, através de seus fundadores, como o povo russo vai adquirindo o sentido evangélico do sofrimento, que difere completamente do que se lhe dá habitualmente.
A partir do século X, se constroem templos majestosos, e a partir do século XI começam na Rus’5N. da T.: Rus' de Kiev ou Rússia Kievana foi uma federação frouxa de tribos eslavas do Leste Europeu dos séculos IX ao XIII, sob o reino da dinastia de Rurik. Os povos modernos da Bielorrússia, Ucrânia e Rússia reivindicam a Rus’ de Kiev como seu ancestral cultural. [Fonte: Wikipédia, em 04/08/2017. Vide: https://pt.wikipedia.org/wiki/Principado_de_Kiev] – como então se chamava a Rússia – a se desenvolverem os mosteiros. No ano 1051, um monge do Monte Atos, chamado Antônio, leva à Rus’ a tradição da comunidade monástica do Monte Atos fundando o famoso Mosteiro das Covas de Kiev, que se converteu no centro da vida cristã da Antiga Rússia.
Santo Antônio foi sucedido por São Teodósio (1074), que aprofundou nesta semeadura um espírito profundamente cristão que se estende à vida pessoal e social do povo russo. Todos os aspectos de seu testemunho e a popularidade que desfrutou atestam a forte influência do cristianismo sobre o povo.
O papel dos mosteiros em Rus’ era enorme. Eram grandes centros de instrução e de trabalho social. Foram escritos manuscritos que conservaram até nossos dias relatos de todos os acontecimentos notáveis da história do povo russo, {não só religiosos (prefiro dizer, espirituais)}.
Nos mosteiros floresciam a pintura de ícones e a arte da escrita de livros; realizavam-se traduções ao idioma russo de obras teológicas, históricas e literárias. A ampla atividade benéfica dos conventos contribuía para a impregnação da vida cristã em todas as manifestações culturais e sociais.
Rus’, durante o período de Kiev (980-1240) alcançou um alto nível de civilização. Sua capital foi a segunda cidade da Europa, depois de Constantinopla. As catedrais de Santa Sofia, erigidas em Kiev e em Novgorod, eram os edifícios mais belos fora de Bizâncio.
Este é o período da fundação e é muito importante discernir as colunas sobre as quais se vai construindo a Igreja da Rússia:
1. O que definiu a escolha da Igreja Bizantina foi a liturgia. E o amor da Igreja russa pela liturgia permaneceria até hoje. Além disso, o rito permaneceria inalterado durante séculos.
2. O Estado e a Igreja estão unidos pelo Evangelho. O Mosteiro é o lugar onde se desenvolvem todas as atividades do povo: espirituais, culturais e sociais. O cristianismo se integra em todas as atividades do povo e seus governantes. E aqui nos deparamos com a segunda palavra que ouvimos do Senhor a Vassula: Integridade. Não nos encontramos com uma religião dos domingos e dias santos, mas com uma maneira cotidiana de viver.
{O cristianismo não é apenas uma religião, mas uma maneira de viver. Assim foi instituído pelo Senhor.}
Em 1237, com a invasão dos mongóis, Kiev foi saqueada e destruída junto com todos os principados russos, com exceção de Novgorod. Devido à destruição de Kiev, o centro vital da Rússia mudou-se para Novgorod, a Grande, principal centro cultural depois de Kiev.
Jesus diz a Vassula (esclarecendo-se que o texto não se refere a este evento especificamente):
Esta nação que uma vez Me honrou e louvou abertamente, radiante como uma safira, uma Cidadela de delícias, foi reduzida a um árido país de seca pelos pecados e crimes do mundo. (03.09.1991)
A invasão dos mongóis causou à Rússia sua destruição econômica. No entanto, a Igreja pôde sobreviver graças à tolerância dos invasores, que respeitaram a espiritualidade do povo, chegando ao ponto de não cobrar impostos aos bispos e suas igrejas. Sustentada pela mão da Igreja, a Rússia manteve-se unida e manteve viva a sua fé durante os dois séculos e meio de ocupação.
No início do século XIV, se somam a Novgorod dois centros políticos crescentes: Rostov, a Grande, e um pequeno principado, Moscou, cuja importância foi crescendo ano a ano graças à capacidade de seus príncipes, que eram a favor de uma unidade autocrática da Rússia (até então eram diversos principados).
{A Rússia era uma quantidade enorme de principados. Cada príncipe tinha sua independência, então era muito facilmente atacada e conquistada. O exército tártaro era absolutamente imparável porque os tártaros tinham dois cavalos e eram capazes de dormir e de comer cavalgando. Suas tropas chegavam muito antes do esperado.}
A Igreja, juntamente com os seus monges, continuou a desempenhar um papel importante no renascimento de uma Rússia unida.
{Porque a Igreja e os monges são uma coisa só, no povo russo, com os monastérios. Assim também digamos que no século IV havia dois cristianismos – é quando terminam os três primeiros séculos de perseguição cristã que teve 7 milhões e setecentos mil mártires. Mas no momento em que Constantino – não sei se era cristão, mas – instituiu a religião cristã como a religião do Estado, ocorrem duas coisas [muito bem dito por São Gregório de Nissa]: “Não sei se vai realizar mais a cristianização dos pagãos ou a paganização dos cristãos." E se produzem dois cristianismos: o cristianismo oficial, ligado de alguma forma ao poder, e o monacato, que é um cristianismo absoluto. Por isso, vão ao deserto. Vão para longe da civilização. Mas o deserto está habitado por outros seres que são os seres diabólicos. Santo Antão, que é o Pai do monasticismo de todo o mundo, vai para o deserto para combater o Maligno.
Então ali se produzem dois cristianismos. Creio pessoalmente que aí começa a decadência do cristianismo, nesse momento. Porque começa a se orientar pelos valores do Estado. Há um exemplo, no primeiro Concílio Ecumênico, em 318, até este momento em todos os concílios realizados havia unanimidade porque a unanimidade indicava que o Espírito Santo estava presente nas decisões. Se chegava a uma conclusão e havia uma unanimidade. Neste Concílio, entre 317 bispos um não estava de acordo. Então o que acontece? Constantino percebe isso, que chegaram a uma unanimidade. Mas aí entra a política no cristianismo. Esta é uma opinião pessoal que eu tenho, mas o acontecimento que estou contando é verdade. Não que eu pense que se tenha que sair do mundo, mas é necessário que um pequeno resto [dos cristãos] cumpra o Evangelho absolutamente, para que o Senhor perdoe a todos nós. De toda forma, no mundo talvez se possa fazer um certo monasticismo citadino, não é necessário se fazer um monasticismo estrito porque o monasticismo russo não era assim.
No princípio, no monasticismo até São Sérgio de Moscou, uma pessoa poderia fazer uma pequenina casa bem feita, com um altarzinho e ali ficava. Depois vinha outro ao lado e assim por diante. Não havia um edifício comum. Cada um tinha sua casinha e se reuniam, mas cada um vivia em sua casa e se juntavam para rezar. Era um pouco a maneira como se vivia no tempo de Jesus. Foi como instituiu Jesus, não havia um edifício chamado igreja. Ecclesia quer dizer ‘convocatória’, não é um edifício. Construir minha igreja é construir minha convocatória ao povo. E assim começou até São Sergio, e nasceram os mosteiros. Só se rezava em comum, nada mais.}
Os notáveis santos russos eram líderes espirituais e colaboradores dos príncipes moscovitas. Santo Aleixo, Bispo de Moscou (1354-1378), educou o príncipe Dimítri Donskóy (Demétrio de Moscou). Ele ajudou o príncipe moscovita a acabar com a agitação feudal e a construir lentamente a unidade do Estado russo. {Dimítri tornou-se um santo, São Demétrio, muito estimado pelo povo russo.}
É no momento em que as forças da nação começam a se concentrar em torno de Moscou que surge o grande santo da Rússia, São Sérgio de Radonej.
São Sérgio nasce em 1313, filho de camponeses ricos de Rostov. Nunca foi muito capaz nem afeiçoado aos estudos; tinha dificuldade em aprender a ler e escrever até que recebeu a bênção de um monge que lhe disse: "a partir de hoje, você vai ser excelente nos estudos e, pela graça divina, poderá entender as Escrituras". Mas ele nunca se destacou nos estudos, apesar da bênção.
{Isto nos indica que o conhecimento de Deus não é o mesmo que o conhecimento do mundo, que o conhecimento intelectual.}
Quando seus pais, já de idade, entraram para um mosteiro para terminar seus dias lá, São Sérgio partiu, junto com seu irmão Estêvão, para uma floresta virgem {na Rússia, o lugar de isolamento não são desertos de areia, mas bosques} e lá construíram uma cabana junto a uma fonte e uma pequena capela dedicada à Santíssima Trindade. Eles viviam em isolamento total.
Seu irmão o deixou, depois de um tempo, à procura de uma vida menos exigente e Sergio ficou sozinho, continuando sua vida de recluso, na companhia de animais da floresta, entre eles um urso com quem compartilhava sua escassa comida.
Aos poucos, suas virtudes foram sendo conhecidas e alguns homens vieram para aprender com ele a dura experiência monástica. {Estamos falando de 25 graus abaixo de zero no inverno, e que Deus proverá, de acordo com a Sua palavra do Evangelho: Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais vos será acrescentado (Mt 6,33) – naquela época não se aceitava esmola.} No entanto, não levavam uma vida comunitária, já que cada um, em sua cabana, organizava seu tempo e administrava seus bens como entendia, consultando Sérgio como um pai espiritual.
Alguns anos mais tarde, contra a sua vontade, foi nomeado abade e diz a seus irmãos:
"Orem por mim, meus irmãos, porque eu não tenho mansidão nem sabedoria, mas recebi do Rei do Céu um talento, e devo prestar contas."
{Este é um ato preciso de humildade: ocupar exatamente o seu lugar.}
A partir da convivência com outros irmãos, se começam a conhecer seus primeiros milagres: doações milagrosas de alimentos que permitem o cumprimento evangélico de não se preocupar com nada; o surgimento de uma vertente de água abundante que até hoje abastece o mosteiro; a cura de um possesso e até mesmo o despertar de uma criança morta.
Junto com as graças recebidas sobrevém uma provação a São Sérgio e aos monges. O Patriarca Filoteu, de Constantinopla, lhe enviou uma carta ordenando-lhe estabelecer a vida comunitária no mosteiro, eliminar as posses pessoais, organizar a economia e distribuir os trabalhos domésticos. Construir uma padaria, um refeitório, um depósito de alimentos; impedir que se comprassem ou vendessem bens no próprio nome, mas que se considerasse tudo como um bem comum.
São Sérgio aceitou [tudo isso] por obediência ao Patriarca e a seu próprio bispo, a quem recorreu para confirmar a ordem.
Apesar desta dificuldade inicial, surgiram outros mosteiros, dirigidos por discípulos de Sérgio: o do Salvador, em Moscou (que seria, mais tarde, decorado pelos afrescos de Andrei Rublev); o da Natividade da Virgem, também perto de Moscou, chamado Simonov; o da Virgem da Montanha, etc.
São Sérgio apoiou fortemente a política de unificação dos principados de Moscou, o que permitiu enfrentar o jugo mongol.
O grande príncipe Dimítri chegou à Abadia da Trindade para lhe pedir aconselhamento e orações porque estava se preparando para a grande batalha contra o exército tártaro, pronto para atacar Moscou. O santo lhe disse:
"Seu dever exige que defenda seu povo. Esteja preparado para oferecer a sua alma e derramar o seu sangue. Mas, primeiro, apresente-se a Khan como se fosse seu vassalo e tente detê-lo por sua submissão. A Escritura nos ensina que, se nossos inimigos reivindicam nossa glória ou desejam nosso ouro e nossa prata, podemos dar-lhes. Ofereçamos nossa vida e nosso sangue apenas pelo nome de Cristo. Ouça, Príncipe: dê-lhes sua glória e suas riquezas, e Deus não permitirá sua derrota; Ele irá elevá-lo ao ver sua humildade e humilhará o indomável orgulho deles."
Mas o príncipe respondeu que as tentativas de evitar a batalha haviam sido esgotadas. Então Sérgio lhe disse: "Vá, então; Deus lhe ajudará. Que Sua graça esteja com vocês".
O Príncipe Dimítri vence pela primeira vez o até então invencível e devastador exército mongol, e este é o começo, não sem grandes dificuldades, da libertação da ocupação mongol.
Trinta anos depois da morte de São Sérgio, seu corpo incorrupto foi depositado na igreja. Todos os grandes movimentos espirituais da Rússia estão ligados a ele, de uma forma ou de outra, porque ele une harmoniosamente as duas tendências do monasticismo autêntico: a vida do eremita e a vida cenobítica (comunitária), mantendo a primazia do misticismo contemplativo unido à importância do trabalho e da atividade caritativa.
No total, desde o século ХIV até meados do século ХV foram fundados na Rus’ cento e oitenta novos claustros monásticos.
Livrando-se dos invasores, o Estado Russo ia acumulando poder, e a Igreja acompanhava esse crescimento.
Em 1448, pouco antes da queda do Império Bizantino, a Igreja Russa tornou-se independente do Patriarcado de Constantinopla, do qual dependia até esse momento. O metropolita Jonas, nomeado pelo Concílio dos Bispos russos em 1448, recebeu o título de Metropolita de Moscou e Toda a Rus’.
Em 1589 o Metropolita de Moscou, Job, tornou-se o primeiro Patriarca Russo, a quem os patriarcados orientais outorgaram o quinto lugar de honra.
O início do século ХVIII foi marcado por reformas radicais de Pedro I, cuja intenção era europeizar a Rússia, inclusive a Igreja.
Depois da morte do Patriarca Adrian em 1700, Pedro I suspendeu a eleição do novo patriarca e em 1721 instituiu um colégio regente eclesiástico superior representado pelo Santo Sínodo Regente (escolhido pelo Czar), que permaneceria como um órgão eclesiástico superior durante quase duzentos anos.
Grande admirador do Ocidente, Pedro, o Grande, queria limitar a inserção da Igreja na vida cultural, na assistência social, eliminando muito do que a Igreja e os mosteiros haviam realizado até o momento: a evangelização da vida social e cultural e política do povo. Por isso, tanto Pedro, o Grande, como Catarina I da Rússia, fecharam depois numerosos mosteiros.
O renascimento da vida monástica veio das mãos de Paissy Velitchkovsky (1722-1794) que, vendo-se impossibilitado de fundar um centro espiritual na Rússia, foi para o Monte Atos [Grécia]6N. da T. , onde permaneceu por 17 anos.
Em seguida, retorna à Moldávia (Romênia) estabelecendo-se no grande mosteiro de Niamtsy, concentrando-se, entre outras atividades, na tradução para o eslavo da famosa compilação de textos de autores ascéticos ortodoxos composta por um monge do Monte Atos: São Nicodemos, o Hagiorita, (1749-1809) e o bispo Macário de Corinto (1731-1805).
Esta obra monumental chamada Filocália7Livro clássico da literatura católica ortodoxa – uma coletânea de textos de autores diversos sobre a Oração do Coração, publicada em Veneza, em 1782. (N. da T., fonte: Wikipédia) (amor à beleza espiritual) (Dobrotolubiye, em eslavo) contém os relatos dos Padres do Deserto que cultivavam o hesicasmo (prática ascética que significa: quietude, silêncio, paz interior, sobriedade) e a "oração do coração", difundida entre os monges cristãos orientais, a partir do século IV com os chamados Padres do Deserto.
Os Padres hesicastas desenvolveram uma Tradição terapêutica que tratava das doenças (paixões) da alma e do espírito, indicando o processo de cura. Entre todos os métodos que foram usados pelos primeiros monges, os dois principais foram:
1. total confiança em um superior, o staretz, a quem se abre o coração até o ponto de revelar os pensamentos mais íntimos;
2. a obediência perfeita. O único combate eficaz contra o poder do ego.
O mérito de Paissy não se limitou à publicação de livros, mas, através da experiência espiritual pessoal na vida comum, ele conseguiu inserir o ideal hesicasta que cultivavam os eremitas na vida de uma comunidade monástica. Esta síntese admirável foi possível graças à restauração da antiga tradição da paternidade espiritual (staretz).
Era a figura viva do staretz que harmonizava a práxis monástica exterior, que consistia na disciplina, regra, ofício litúrgico e ascese corporal; e a práxis interior, constituída de combate espiritual, oração do coração e o discernimento dos espíritos. Esta experiência fez dos grandes mosteiros na Moldávia, guiados por Paissy, uma verdadeira escola de staretz [que depois entrou na Rússia].
É o retorno às fontes do monasticismo de São Sérgio, que se acredita quase com certeza que praticava o hesicasmo.
Na Rússia, a Filocália eslava converte-se no veículo de um verdadeiro e próprio renascimento espiritual.
No final do século XIX, é publicado um livreto: "Relatos de um peregrino russo", escrito por um autor anônimo que narra de forma autobiográfica a peregrinação física e espiritual de um peregrino anônimo para alcançar o conhecimento da oração interior contínua. Toma o caminho da oração do coração como um método para acostumar o espírito ao recolhimento e fazer com que se acenda no espírito, pelo Espírito Santo, a chama da verdadeira oração e do verdadeiro amor como caminho para Deus.
O século ХIХ deu grandes exemplos de santidade russa: os bispos metropolitas de Moscou Filareto e Inocêncio, São Serafim de Sarov, São Inácio Brianchaninov, São Teófano, o Recluso.
Comunismo
A partir de 1917, irrompe na Rússia o movimento político mais assassino e selvagem de todos os tempos: o comunismo.
Nos primeiros anos do poder bolchevique, o procedimento básico se norteava pelo decreto de Lênin, de 23 de janeiro de 1918, baseado na separação entre Igreja e Estado. Na sequência deste ato legislativo, deu-se uma campanha brutal de confisco de propriedades da Igreja, durante a qual foram presas e assassinadas muitas pessoas, ao mesmo tempo em que o ensino religioso era abolido nas escolas e nas instituições de ensino nacionalizadas, inclusive os seminários.
Nos anos seguintes, foram realizadas inúmeras campanhas contra a Igreja Ortodoxa. Em 1919, foi promulgado o decreto sobre a extinção do culto às relíquias, o que compreendeu a profanação de inúmeras igrejas e corpos de santos {foram queimados}. Em 1922, deu-se a requisição de objetos preciosos da Igreja, o que desencadeou numerosas reações entre os fiéis, mas o governo respondeu com uma dura repressão.
{foram queimados}. Em 1922, deu-se a requisição de objetos preciosos da Igreja, o que desencadeou numerosas reações entre os fiéis, mas o governo respondeu com uma dura repressão.Não só a Igreja Ortodoxa foi vítima das perseguições, mas também todas as igrejas e comunidades. Todas sofreram uma política de erradicação da vida social e pessoal dos cidadãos soviéticos. Era – como foi escrito em um manifesto de propaganda em 1923- "a luta decisiva contra o papa, chamado de pastor, abade, rabino, patriarca, mulá ou Papa; esta luta deve ser realizada da mesma forma contra Deus, que é chamado de Jeová, Jesus, Buda ou Alá."
Quando Khrushchov assumiu o poder, ele mesmo anunciou ao povo que já haviam matado 20 milhões de cristãos ortodoxos. Se considerarmos que continuou com as perseguições de um modo tão violento quanto seu antecessor, podemos acrescentar outros milhões de mártires cristãos.
O Senhor disse a Vassula:
Como poderei descrever tudo quanto seus filhos sofreram? A que poderei compará-los, filha? Todo o Céu estava de luto pelos seus filhos. Os seus filhos estavam completamente indefesos, mas quem estava, então, a seu lado, para chorá-los? Haveria, entre eles, alguém suficientemente forte para trespassar o Dragão? Não, nem quando sua pele colou em seus ossos. Seus filhos passaram a mendigar Pão; oprimidos pelo inimigo, sucumbiram sob seu fardo. Se, em segredo, tentavam encontrar refúgio em Meus Braços, eram severamente punidos. Não lhes era permitido demonstrar seu zelo por Mim. Os seus perseguidores eram mais rápidos que serpentes e espiavam cada passo que davam; e, se suspeitassem que escondiam sob o colchão o Livro da Vida, Meus filhos eram vexados e perseguidos e, depois, capturados.
Ah! Minha filha! Os Meus Olhos choraram sem cessar ao ver essa nação constrangida ao silêncio pela espada. Sacerdotes e profetas eram feitos prisioneiros e eram forçados a habitar na escuridão. Muitos deles foram massacrados, sem piedade alguma, diante dos Meus Próprios Olhos. (03.09.1991)
{Esse texto é a prova inquestionável da liberdade que Deus dá ao Homem. Deus não pode intervir na obra humana, pela liberdade que Deus lhe deu. Deus correu o risco de dar a liberdade ao Homem. Claro, Deus é onipotente. Mas não vai tirar essa liberdade. O que Ele pode fazer é inspirar alguém pelo Espírito Santo para ganhá-Lo, mas não fará nada por Sua Própria Conta. Exceto a destruição total: isso Ele nunca irá permitir.}
No século XX calcula-se que morreram 45 milhões de cristãos; são mais mártires do que no resto da história do cristianismo. E esta matança continua hoje, neste século XXI, com o martírio e a destruição de suas igrejas de centenas de milhares de cristãos ortodoxos na Síria, Egito e África, com muito pouca informação da imprensa ocidental, e uma fraca reação das igrejas irmãs ocidentais.
Despertar da Igreja Ortodoxa Russa da Cruz do Comunismo
Me limito a ler umas palavras de boas vindas do Metropolita Cirilo de Smolensk para a juventude ortodoxa na Rússia em 1º de junho de 1992.
“Às vezes me pergunto como pudemos sobreviver durante estes anos de cativeiro babilônico, como encontramos força para ajudar a Igreja Ortodoxa a superar o genocídio desencadeado. Porque é nestes termos que devemos falar das perseguições dos anos 20 e 30. Como pôde a Igreja superar os ataques tão perigosos da época de Khrushchov? De onde tirou a força para sobreviver e manter-se nos parâmetros estreitos do regime de Brejnev?
Só vejo uma resposta. A igreja foi despojada de tudo: de edifícios, da possibilidade de dar uma educação religiosa, de entregar-se a obras caritativas, de publicar jornais e livros. Tudo o que restava à Igreja Ortodoxa era a Divina Eucaristia compartilhada por toda a comunidade cristã. O que os ateus chamavam de "culto", considerando que o culto é o que tem menos influência sobre as pessoas, enquanto a educação e os meios de comunicação são, na verdade, o que tem mais poder, {segundo eles.} Mas estavam enganados porque da Divina Liturgia a Igreja tirou toda a sua força e se manteve viva porque pôde, como assembleia de fiéis, reunir-se em torno da mesa do Senhor e celebrar a divina Liturgia Eucarística.”
{Perceberam a importância da Liturgia?}
Jesus diz a Vassula:
A Rússia será o símbolo da Glória de Deus, da Misericórdia de Deus e de Seu Amor. Seus hinos e cânticos, que são tão doces a Nossos Ouvidos, com seus movimentos graciosos, se elevarão ao Céu como incenso. O Amor a ressuscitará como Ele a ressuscitou há mil anos. (01.02.88)
“Em que situação se encontra a Igreja hoje? Tem todas as possibilidades de agir livremente. Usufruímos legalmente de liberdade religiosa. Podemos abrir igrejas e mosteiros – e temos nos dedicado a isto, com êxito, há quatro anos. Abrimos cerca de 7.000 novas igrejas. Se considerarmos que até 1988 tinha apenas 7.000 igrejas, vemos que o número dobrou.
O número de mosteiros também aumentou muito no mesmo período, passando de 16 para 149. Tínhamos dois seminários e duas academias de teologia. Agora temos oito seminários, três academias e vinte colégios de teologia que oferecem um programa de seminário acelerado, com o objetivo de treinar os membros do clero o mais rápido possível. Paróquias são criadas livremente: basta que os fiéis tenham a coragem de desejar isso. Se dez pessoas manifestam o desejo de abrir uma paróquia, o registro pode ser feito sem dificuldade alguma por parte das autoridades civis.”
Jesus diz a Vassula:
Para honrar Minha Nobreza outra vez em ti, abri tuas Igrejas, uma em seguida a outra, chamei-te pelo teu nome naquele Dia: Rússia para alegrar-te e ficares feliz, e para celebrar a Festa da Minha Transfiguração. (13.12.1993)
{Rússia: cai o sistema soviético na semana da Transfiguração. A Transfiguração é a única festa que todas as denominações cristãs celebram, no Dia da Transfiguração. E também se comemora o Dia da Desfiguração: é o da primeira bomba atômica, em Hiroshima. Um dia significativo também. Por um lado, a Transfiguração, por outro lado, a desfiguração.}
“Mas junto com as alegrias temos muitas dificuldades, muitos problemas e muitas dores... Desde 1917, três gerações viveram sem qualquer formação religiosa. Não falo só de escolas, mas de serviços religiosos, porque nem todos tinham a coragem de ir abertamente à igreja... {Se alguém fosse descoberto como cristão, perdia todos os trabalhos importantes. Porque havia o registro disso. E também não podia estudar.} Este país não pode mais ser chamado de Santa Rússia, precisamente porque o conjunto da população do País durante estes 70 anos já não possui a Tradição Ortodoxa... As coisas mais elementares que o povo russo soube desde sempre, como persignar-se ou o que significam as festas do Natal ou da Páscoa, são desconhecidas pelo povo de hoje.
Portanto, a tarefa mais importante para a nossa Igreja, hoje, é uma nova missão, uma nova cristianização do povo, um renascimento da Tradição, da educação ortodoxa.”
Jesus diz a Vassula:
Te dou a Minha Paz. Eu sou a Ressurreição e a ressurreição vai acontecer em breve na Minha filha Rússia. Não sejais juízes de seus filhos e filhas para que Eu não Me veja obrigado a julgar-vos. Se houvesse alguém perfeito entre vós, ainda assim não valeria nada diante da Minha Perfeição. Em breve Me será dada a Glória na sua plenitude e a Rússia governará o resto dos Meus filhos em santidade. (20.10.92)
Algumas Reflexões
Ao longo de sua história, o povo russo expressou uma atração pelos extremos, como indica o historiador Pierre Kovalevsky, irmão do monsenhor Jean. Estamos diante da nação que mais glorificou a Deus e, ao mesmo tempo, a que mais O rejeitou (ateísmo).
No entanto, apesar destas vicissitudes históricas, Jesus manteve Sua preferência pela Igreja Russa, como expressou a Vassula. O que isso nos ensina? Jesus quer que tenhamos a capacidade de chegar até as últimas consequências em nossas ações. Desta forma nos prepara para que O amemos até o fim. O Senhor rejeita a tibieza. Ele diz no livro do Apocalipse (à Igreja de Laodicéia): Oxalá fosses frio ou quente, mas porque és morno, vou vomitar-te da minha boca (Ap 3, 15-16).
Por isso, o Senhor adverte Vassula de que a Rússia pode correr o risco de ir para o outro extremo:
Mas se ela perverter a liberdade que lhe dei e Me afastar de seus pensamentos, ainda que por um momento, vou permitir que um inimigo a invada... Se a Rússia não voltar para mim com todo seu coração e me reconhecer com um coração indiviso, como seu Salvador, vou enviar sobre ela um exército grande e poderoso, e a partir dela a todas as nações. Um exército como nunca antes se viu e nunca se verá outra vez até anos remotos, e o céu vai ficar negro e vai tremer, e as estrelas perderão seu brilho...(13/12/1993)
A Rússia é um povo profético: anuncia e sofre com antecedência o que vai acontecer ao mundo. Já viveu ao extremo o ateísmo e o antiteísmo que agora está inundando o mundo. {O ateísmo é não crer em Deus e o antiteísmo é destruir os que creem em Deus.}
Enquanto o mundo está experimentando o progresso deste flagelo, ela já está fazendo a nova evangelização dos seus fiéis.
O povo russo tem consciência de ser pecador – de onde provém o impulso para a santidade.
{Não há impulso à santidade sem a autoconsciência do próprio pecado. Na Bíblia há dois momentos - um com o Profeta Isaías e o outro com o Apóstolo Pedro – que alguns teólogos ortodoxos citam como modelo de conversão. Pedro, quando recolhe a rede carregada de peixes depois que Jesus lhe diz para lançar a rede de novo, tendo passado uma noite inteira sem conseguir pescar nada, estupefato diz: "Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador!" Não é a consciência apenas dos pecados, mas da distância entre o homem e Deus, estando o homem diante de Deus.}
O nome da "Santa Rússia" não é uma palavra vazia porque o ideal de santidade representa o valor mais alto para a Rússia, que está acima do bem-estar e da conquista. Santidade é dar a vida, não é o cultivo das virtudes. É um esvaziamento para receber o Espírito Santo.
{Um exemplo, de Santa Teresinha do Menino Jesus. Uma noviça que admirava muito Santa Terezinha de Jesus lhe disse um dia: “quantas virtudes terei que adquirir para chegar à tua santidade?” E Terezinha lhe respondeu: "Adquirir? Não! Esvaziar-se!" Para que esvaziar-nos? Serafim de Sarov nos responde:}
O verdadeiro propósito da nossa vida cristã é a aquisição do Espírito Santo de Deus. O jejum, a vigília, a oração, a esmola e todas as boas obras, feitas em nome de Cristo, são meios para receber o Espírito Santo de Deus. Apenas as boas obras realizadas para Cristo nos trazem os frutos do Espírito Santo.
{Serafim de Sarov é o santo do Espírito Santo.}
A espiritualidade russa dá um lugar de destaque ao martírio em nome do Senhor ou de Sua Palavra. A Palavra do Senhor deve ser cumprida e Sua vida, tomada como exemplo. Os monges chamam seus santos: "muito semelhantes a Cristo”.
Para eles, o martírio ou o sofrimento é o meio para cumprir o novo mandamento do Senhor: amai-vos uns aos outros como Eu vos amo. (Jo 13, 34) E como esse amor se manifesta? Dois capítulos adiante, o Senhor nos responde: Não há maior amor que dar a vida pelos irmãos (Jo 15,13) É o amor até o fim, o que ouvimos de João na Última Ceia (Jo 13, 1).
O herói russo não é o guerreiro nem o conquistador, mas o santo. E o santo representa outro tipo de guerreiro: {não é ser bonito, cultivar as virtudes, ser um homem que não discutia...} é aquele que faz guerra contra si mesmo, que é a guerra mais difícil e dolorosa. {dizem os monges, os padres hesicastas} A guerra contra as paixões do mundo, enraizadas no eu, e a guerra atual contra o individualismo e o narcisismo.
{“Eu tenho a minha própria religião.” A evangelização não é uma invasão. A religião é o exemplo que nos dá o Evangelho de João. Quando estão dois discípulos de São João Batista e passa Jesus e João Batista lhes diz: “Eis o Cordeiro de Deus, eis aquele que tira os pecados do mundo.” Então os dois discípulos – João e André – o seguem. Jesus lhes diz: “O que procurais?” E eles Lhe dizem: “Senhor, onde moras?” Ele responde: “Vem e vê.” É isto exatamente a Evangelização. Vem e vê.}
Por isso é muito importante, nesta guerra contra si mesmo, o guia espiritual, o staretz, homem com experiência nas doenças do corpo, da alma e do espírito, que são os obstáculos para a união definitiva com Deus.
{Nós vemos com os olhos físicos porque ficamos cegos dos olhos espirituais. Os olhos físicos podem ver tudo menos a si mesmos, não podemos nos ver. Por isso é imprescindível o orientador espiritual, o staretz. Ele é encarregado de nos abrir os olhos espirituais. Eu me vejo através dos olhos interiores. São os olhos espirituais. Os staretz são muito mais profundos e sábios que os psicólogos de hoje. Há uma psicologia dos Padres do Deserto, dos hesicastas, do século IV, até o século XX, que é extraordinária, absolutamente desconhecida do Ocidente. Os padres do deserto sabem quais são as condições da alma, o que está acontecendo com a alma, como curar as paixões, se é uma doença transitória, se é uma doença psíquica, espiritual ou corporal... O orgulho é uma paixão espiritual. A paixão é uma absolutização de algo bom que, com o excesso, passa a ser mau. Como a água, que é essencial, mas uma inundação mata as pessoas.}
Teófano, o Recluso, {um grande staretz russo do século XIX} diz:
A finalidade do espírito [...] é manter o homem em contato com Deus e com as realidades divinas, independentemente de todos os fenômenos visíveis que o rodeiam [...] Esta visão espiritual existia no primeiro homem até o momento da Queda. Seu espírito via claramente Deus e todas as coisas divinas, tão claramente como vemos hoje um objeto colocado à nossa frente. Mas depois da Queda os olhos do espírito ficaram cegos, e o homem deixou de ver o que anteriormente via com toda naturalidade. O espírito permanece, no entanto, e tem olhos, mas eles estão fechados; é como um homem cujas pálpebras estiveram grudadas; o olho está intacto [...], mas as pálpebras fechadas não lhe permitem entrar em contato direto com ela. Tal é o estado de espírito do homem após a Queda. O homem tentou substituir a visão do espírito pela visão do intelecto, por construções mentais abstratas, por ideologias, mas foi em vão, como provam todas as teorias metafísicas dos filósofos.
A maioria do povo russo aceitou a mensagem do Evangelho desde sua origem e consagrou sua vida aos mandamentos de Cristo. Até aqui se vê, como coluna da Tradição espiritual da Rússia, um modo cristão de vida, e isso é muito importante como acontecimento fundador; a vida pessoal é impregnada pelo Evangelho. Cultivam um cristianismo íntegro, não fragmentado.
E qual é a semente desta fidelidade ao Evangelho? O amor do povo russo pela liturgia, o primeiro amor, como vimos no início.
Os russos dizem que a liturgia é uma bíblia sonora. Dou este exemplo com as palavras de São João de Kronstadt (1829-1908) sobre a liturgia:
E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do mundo. (Mt 28,20). Tu estás conosco através dos tempos; e não estamos um único dia sem Ti. E não podemos viver sem a Tua Presença! Estás especialmente nos sacramentos do Teu Corpo e Sangue! Em cada Liturgia tomas um Corpo semelhante ao nosso, exceto no pecado, e nos alimenta com Tua carne Vivificada. Através deste Sacramento estás plenamente conosco, e Tua carne se une a nossa carne, enquanto o Teu Espírito se une a nossa alma; e sentimos esta união dulcíssima, vivificadora, de profunda paz, e assim unidos a Ti nos tornamos um só espírito Contigo; tornamo-nos como és – bons, mansos e humildes, assim como disseste: Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração (Mt 11,29). Como em Cristo Jesus habita toda a plenitude da Divindade, assim também essa plenitude habita no Sacramento Vivificador do seu Corpo e Sangue puríssimos. No pequeno corpo humano cabe toda a plenitude do infinito, a Deidade incompreensível; e no pequeno "Cordeiro" ou "Pão Eucarístico", na menor partícula, habita a plenitude Divina. Glória à Tua onipotência e bondade, Oh Senhor!"
O cristianismo russo está purificado pelas terríveis provações a que foi submetido. É um povo sofrido e alegre ao mesmo tempo. Passou por tremendas provas que quase levaram à sua destruição, mas foi capaz de superar pela força espiritual de sua fé.
Ele também sabe, através de seus santos, que as provas são a grande honra de participar do Cálice de Cristo, e isso lhes dá uma densidade espiritual, uma profundidade mística e humana, ao mesmo tempo em que desafia o conforto morno dos sentimentos depressivos.
Lerei para vocês um texto de Santo Inácio Brianchaninov:
Se estás disposto a suportar o desagradável sabor amargo dos medicamentos, a dolorosa amputação e cauterização de teus membros, os tormentos prolongados da fome, a longa reclusão no teu quarto, e suportas tudo isso a fim de restaurar a saúde perdida de teu corpo que, uma vez curado, voltará a cair doente, sem dúvida alguma, e com total certeza morrerá e se decomporá, suporta, portanto, a amargura do Cálice de Cristo, que garantirá a cura e a bem-aventurança eterna a tua alma imortal.
Se o Cálice te parece insuportável, trazendo a morte, isso te desmascara: ainda que te chames de cristão, não pertences a Cristo. Para Seus verdadeiros discípulos, o Cálice de Cristo é um cálice de júbilo.
O povo russo teve, pelo menos, três provas terríveis que o levaram quase até a destruição definitiva. Ele sofreu pilhagem política, econômica e espiritual. No entanto, soube se recuperar destas experiências terríveis de morte e destruição pela força espiritual dos seus santos. Através deles, sempre escolheram voltar às fontes de seu nascimento para fazer da experiência da Cruz a feliz e gloriosa passagem do despertar.
E, nesse sentido, a Igreja Russa continua o seu destino profético anunciando a todos os cristãos o caminho da unidade no amor de Cristo: a peregrinação do retorno às nossas origens. Jesus anuncia a Vassula em Sua mensagem de 8 de julho de 1990:
Tenho a intenção de vesti-los todos com Minhas vestes de antigamente, e reconstruir a Minha Igreja sobre suas antigas fundações (a Igreja primitiva). Adornarei Minha Esposa com suas primeiras joias, e com vossas bocas Me exultareis e Me louvareis sem cessar. (08.07.90)
As fontes do cristianismo primitivo não pertencem a nenhuma igreja em particular, mas àqueles que, no Espírito Santo, desejam ser ensinados e, assim, recordar as palavras do Senhor para cumpri-las devagar e silenciosamente até o fim. Lembram-se das palavras do Senhor?:
Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu Nome, Ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que Eu disse. (Jo 14, 26)
Esta presença do Espírito Santo nos guiaria até o Pentecostes, o nascimento da Igreja de Cristo. E o que aconteceu naquele dia glorioso?
O Espírito Santo se manifestou a toda a comunidade como um vento impetuoso, e pousou como línguas de fogo sobre cada um dos presentes.
No vento impetuoso está a transmissão da força, da energia, do dinamismo necessário para realizar e transmitir a conversão. E no fogo que pousa sobre cada um se manifesta a vocação pessoal, o lugar único de cada um para a missão. Então, as diferenças deixam de ser objeto de controvérsias para se transformarem em uma sinfonia de encontros.
A individualidade passa a ser uma distinção que enriquece, uma novidade bem-vinda oferecida à fecundidade do "nós".
Concluo com algumas palavras de São Serafim de Sarov:
O próprio Espírito Santo vem habitar em nossas almas; e esta morada e a coexistência em nós do Todo-Poderoso, de sua Unidade Trinitária com nosso espírito, nos são dadas para nada mais do que a condição de trabalhar, por todos os meios ao nosso alcance, para a obtenção do Espírito Santo e isso prepara em nosso corpo e nossa alma uma habitação digna deste encontro, um trono para a convivência do Deus que tudo criou com nosso espírito. Como diz a palavra imutável de Deus: E habitarei e andarei no meio de vós; vós sereis o meu Povo, e Eu serei o vosso Deus. (Lv 26,12)
Notas de rodapé.
1Presbítero ortodoxo, pertence à Paróquia San Martín de Tours desde 1978, em Buenos Aires, Argentina.
2Em duas igrejas de Buenos Aires: a primeira, do padre Matias Morea, Pároco de N. Sra do Perpétuo Socorro e a segunda, do padre Daniel Aguilera, católico romano, Pároco da Igreja do Menino Jesus de Belém, que participou do IX Retiro Latino-americano A Verdadeira Vida Em Deus, em Aparecida, SP, em novembro de 2016.
3Os trechos entre chaves são comentários do palestrante não incluídos no texto escrito de sua palestra original, transcritos e traduzidos do áudio da palestra. (N. da T.)
4Doutrina do Esvaziamento de Jesus Cristo. Cristo, sendo Deus, ao vir ao mundo Se esvaziou de Seus atributos divinos - transcendência, onisciência, onipotência, onipresença, Sua total Glória e esplendor - para se tornar igual aos Homens, exceto no pecado. (N. da T. Fonte: Wikipédia, em 24.08.2017)
5N. da T.: Rus' de Kiev ou Rússia Kievana foi uma federação frouxa de tribos eslavas do Leste Europeu dos séculos IX ao XIII, sob o reino da dinastia de Rurik. Os povos modernos da Bielorrússia, Ucrânia e Rússia reivindicam a Rus’ de Kiev como seu ancestral cultural. [Fonte: Wikipédia, em 04/08/2017. Vide: https://pt.wikipedia.org/wiki/Principado_de_Kiev]
6N. da T.
7Livro clássico da literatura católica ortodoxa – uma coletânea de textos de autores diversos sobre a Oração do Coração, publicada em Veneza, em 1782. (N. da T., fonte: Wikipédia)
Que Deus nos abençoe.
Leonardo Cesar Harger
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